Reflexão para o 16º Domingo do Tempo Comum | 17 JULHO 2022 – Ano “C”
Por Dom Pedro José Conti
Naquele tempo, entre os padres que se tinham retirado no deserto de Sceti, vigorava uma norma rigorosa. Os monges deviam jejuar a semana inteira que antecedesse a Páscoa. Aconteceu, porém, que justamente nessa semana, alguns irmãos chegaram do Egito para visitar o Abá Moisés, que lhes preparou uma simples refeição. Vendo a fumaça, os vizinhos disseram aos padres do lugar:
– Vejam, Moisés quebrou a obrigação e está cozinhando. Os padres responderam:
– Quando sair da Quaresma, falaremos com ele. Chegou o sábado e os padres, que conheciam a integridade do Abá Moisés, disseram para ele na frente de todo o mundo:
– Ó Abá Moisés, você infringiu o mandamento instituído pelos homens, mas cumpriu o mandamento de Deus.
Antigamente, a obrigação de acolher quem andava peregrinando por lugares pouco habitados era uma regra sagrada. Não era uma questão de amizade; o que estava em jogo, muitas vezes, sobretudo para os pobres, era a própria sobrevivência do viajante sujeito à fome, à sede, ao frio, aos caprichos das chuvas e ao perigo dos assaltantes. Na Bíblia, temos muitas histórias bonitas de acolhida, mas também algumas de maldade com os viajantes. No evangelho de Lucas deste 16º Domingo do Tempo Comum encontramos Jesus que, em suas andanças, é acolhido com muita atenção na casa de duas irmãs: Marta e Maria. Aqui não é nomeado Lázaro, que no evangelho de João é o irmão delas e é chamado de “amigo” de Jesus. Da família, que morava naquela casa de Betânia, não são lembrados nem o pai e nem a mãe, só os irmãos. Talvez uma antecipação da própria Igreja comunidade “fraterna”, ou seja, de irmãos e irmãs. O assunto dessa página do evangelho é, portanto, a hospitalidade, e o hóspede que deve ser acolhido é nada menos que Jesus.
Logo percebemos que as duas irmãs o acolhem de maneira muito diferente. Marta se preocupa, digamos, da parte material, ou seja, do necessário para que Jesus não passe necessidade. Muitos afazeres para que tudo esteja pronto na hora e na maneira certa. Por isso, a própria Marta pede a Jesus que diga à irmã dela, Maria, que a ajude nas tarefas domésticas. Após toda essa apresentação, o evangelista Lucas, aproveita para nos transmitir o ensinamento “novo” de Jesus. Digo “novo” porque esta devia ser também a velha questão discutida e debatida na comunidade do evangelista Lucas. Em geral, essa dúvida é mal colocada. Não se trata de decidir se vale mais ficarmos sentados aos pés de Jesus para ouvir a sua palavra ou trabalhar para que tudo esteja em ordem e não falte nada na mesa. O que precisamos entender é que, quaisquer que sejam as nossas ocupações, afazeres ou responsabilidades, tudo deve ser reconduzido a uma “fonte” ou a um “centro” que, justamente, dê sentido a tudo aquilo que fazemos. “Uma só coisa é necessária” diz Jesus. É a motivação central, que nos faz agir de uma forma e não de outra, que deve ser buscada e encontrada.
Não são as muitas tarefas em si que nos distraem, mas a confusão dos sentimentos e razões. Se tudo se torna importante, corremos o perigo de que, de fato, nada seja realmente merecedor do nosso compromisso mais esmerado. Precisamos escolher algumas prioridades em nossa vida, ou talvez uma só e a partir dela construir o nosso jeito de gastar o tempo, a energia, os dons que de graça recebemos. Maria, diz Jesus, “escolheu a melhor parte que não lhe será tirada”, ou seja, dando atenção à palavra do Senhor, ela está buscando entender a proposta de vida dele e aprender com ele o que vale mais, o que pode ficar para depois ou até o que deve ser reconhecido inútil. Somente se colocarmos ordem nos nossos afetos e afazeres conseguiremos encontrar a paz do coração e o rumo certo de nossa vida. Podemos dizer assim: Marta é, temporariamente, distraída, mas poderá encontrar unidade em sua vida. Maria não é, temporariamente, folgada e preguiçosa. Ela encontrou na palavra do Mestre Jesus a luz que iluminará todo o seu agir. Maria saberá como, porque e para quem empregar os dias de sua vida. Obedecerá ao grande mandamento que Jesus nos deixou, o mandamento do amor. Não seguirá as modas passageiras e as confusões do mundo. Nem o jejum, se precisar.