Por Dom Pedro José Conti – Bispo de Macapá
Conta uma anedota da vida de Papa São João XXIII que, quando ele era ainda núncio apostólico em Paris, participou de uma recepção e lá se encontrou com o rabino Chefe da França. Quando chegaram na porta de entrada, que era bastante estreita, o patriarca deu a preferência ao rabino dizendo-lhe: “Por favor, é bom que passe na frente o Antigo Testamento, depois virá o Novo!”
Neste domingo, celebramos a solenidade da Epifania que significa “manifestação”. Os misteriosos “magos” que vêm do Oriente e seguem a luz da “estrela” representam, com bastante clareza, todos os povos, de qualquer origem e etnia, que virão para adorar o recém-nascido. Essa é uma forma, muito bonita e grandiosa, que o evangelista Mateus encontrou para apresentar e propor a pessoa de Jesus como irmão “universal”, solidário como a humanidade inteira e, para quem o acolher e acreditar, salvação oferecida a todos. Com efeito, sempre nos perguntamos por que após tantos séculos de preparação e de espera, que nós cristãos chamamos de Antigo Testamento, aquele povo escolhido não soube reconhecer o Messias? Ou, melhor, por que bem poucos o seguiram? Diferentemente, o anúncio cristão se espalhou rapidamente pelas estradas do então Império Romano e por outros tantos caminhos chegou até nós. Têm muitas explicações que, para quem acredita, não dependem somente das capacidades humanas. Nós acreditamos na força do Espírito Santo. Ele se antecipa à chegada dos próprios missionários e evangelizadores. É ele, o Espírito, que abre os corações ao dom da fé. No entanto, a solenidade da Epifania nos convida sempre a abrir também os nossos horizontes.
O Messias Salvador não é patrimônio somente de alguns, nem exclusividade para raros escolhidos. É verdade que foram poucos a iniciar a missão do anúncio do Evangelho, mas Jesus deixou claro que devia ser para “todas as nações” e “até os confins da terra”. Ou seja, sem distinções ou exclusões. A mensagem do Reino de Deus deve ser oferecida a todos e a variedade dos povos, línguas, raças e culturas, explica o nome de Igreja “católica” capaz de acolher tanta riqueza de diversidades. Podemos chegar à mesma conclusão, a partir de outro ponto de vista: não precisa mudar de costumes e de tradições para acolher o Evangelho de Jesus. Cada um de nós é chamado a viver a fé no Senhor a partir da sua real situação. É essa “condição humana”, com to das as s uas diversidades e, ao mesmo tempo, com toda a sua universalidade que deve ser transformada pela Boa Notícia do Reino. Acreditamos que não serão costumes vindo de fora a mudar uma certa realidade. Será a luz do Evangelho a fazer reconhecer quanto uma cultura está mais perto, ou mais longe ainda, do mandamento do amor.
Qualquer ser humano, em qualquer lugar do mundo, está consciente da sua fragilidade, da seriedade das consequências das próprias escolhas entre os caminhos do bem e do mal, da beleza de ter mais amigos e nenhum inimigo, da força da solidariedade e da alegria da partilha. A humanidade toda sente um grande chamado à fraternidade, à paz, ao enriquecimento na troca dos saberes e sabores, das artes, das músicas e das danças. Não existe uma “cultura” verdadeiramente humana que não tenha em si os germes do Evangelho, a marca registrada daquela “imagem e semelhança” com o Deus criador, Pai de todos os povos e nações. Em época de globalização do consumo, do individualismo e da indiferença, precisamos resgatar a “globalização do amor”. Não importa se, como cristãos e católicos, formos muitos ou pouc os, o que interessa é apontar sempre o bem, a luz, a verdade, a justiça, além dos próprios interesses e vantagens. Todas as vezes que alguém descobre que a bondade, a misericórdia e a compaixão, são melhores que o ódio, a vingança e a violência, já está colaborando com a vitória do Amor. Não seremos nós, carregados com as nossas ideias e culturas a sermos “universais”, será ele, o único Senhor e Salvador de todos, Jesus Cristo, que os Magos finalmente encontraram e adoraram! O que nos cabe é apontar o Caminho, como a estrela. Felizes por sermos pequenas luzes.