Artigo de dom Pedro Conti: Os ossos

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Dom Pedro José Conti

Bispo de Macapá

Um cristão muito estudado acreditava que a Bíblia fosse verdadeira, ao pé da letra, em cada detalhe. Certo dia, um colega falou com ele e lhe disse: “Segundo a Bíblia, a terra foi criada cerca de cinco mil anos atrás. Mas foram encontrados ossos que demostram que a vida existe sobre este planeta desde muitos milhares de anos”. A resposta do erudito foi imediata: “Quando Deus criou a terra, cinco mil anos atrás, ele mesmo escondeu aqueles ossos debaixo da terra, para ver se mais tarde nós teríamos acreditado mais nas afirmações da ciência ou na sua Santa Palavra!”

Uma pequena história para entender que a Palavra de Deus tem muito mais para nos dizer que simplesmente aquilo que lemos. O que pode parecer uma dificuldade e até nos afastar dela, na realidade descortina para nós horizontes impensáveis que descobrimos aos poucos no caminho da fé. A partir do Terceiro Domingo da Quaresma, deste ano, encontramos três páginas do evangelho de João, que marcam o itinerário da Iniciação Cristã, ou seja, as etapas pelas quais os catecúmenos deviam passar, antes de receber o Batismo na noite de Páscoa. Era necessário que eles reconhecessem não somente quem era e é – Jesus em si – mas, sobretudo, quem ele é para cada um de nós. A cada três anos, a Igreja propõe a todos os que já são cristãos estes evangelhos para nos ajudar a reavivar o que aconteceu no dia do nosso Batismo. Naquele dia, nós, ou, se éramos muito pequenos, os nossos pais e padrinhos, optamos por Jesus Cristo, pelo compromisso de segui-lo junto aos irmãos e irmãs na comunidade que, acreditamos, mantem viva a memória dele e celebra a sua presença na história, até a sua volta final.

O evangelho de João é o mais elaborado e o mais simbólico dos evangelhos, usa imagens comuns e contrastes entre elas para nos conduzir a algo mais. A primeira imagem que encontramos, neste domingo, com o evangelho da samaritana é aquela da água. Nada de mais comum e de mais necessário. O próprio Jesus tem sede e pede água à mulher. Esta, por sua vez, foi ao poço para se abastecer de algo que não podia faltar em sua casa. No diálogo com ela, Jesus a conduz a perceber que cada pessoa humana precisa de algo mais do que de uma água simplesmente material. Ou seja: no coração humano tem uma sede que não fica satisfeita somente com a água do poço, ou da torneira, em nossos dias. Basta parar para refletir e tudo fica claro.

Todo ser humano tem necessidades materiais, simbolizadas pela fome e pela sede, mas fica muito empobrecida a sua existência se não tem outros sonhos e desejos, se não tem motivações maiores do que essas simples satisfações imediatas. Desde sempre, as pessoas buscam um sentido da vida, do seu amar e sofrer, do seu destino, no breve laço de tempo que lhes é dado neste mundo. Sempre, mas muito mais hoje, podemos passar a vida sem nos pôr questionamentos. Os bens materiais, e o primeiro é o dinheiro, nos fascinam tanto que podemos gastar toda a vida só para procurá-los. É o consumo. Outros buscam o sucesso, a fama, querem sobressair do anonimato. Outros preferem cuidar da saúde, da beleza e das aparências físicas. Outros acham que a vida deve ser aproveitada e que o mundo oferece diversões mais que suficientes para isso. Existem, afinal, muitos tipos de “drogas” para entorpecer a nossa consciência e nos fazer sentir na moda, sempre jovens, divertidos e atualizados. Se com tudo isso ficamos satisfeitos, a nossa busca acaba e, assim, acabará também a nossa vida. No entanto Jesus se revela para a samaritana como aquele que oferece uma “água viva” que, evidentemente, no dizer dele, pode satisfazer de vez aquela outra sede que o ser humano tem, mas que corre o perigo de abafar de baixo de tantas propostas e aparentes novidades. É a sede profunda do sentido da vida, de quem tem a ousadia de olhar além das coisas e das circunstâncias imediatas.

Cada ser humano não é simplesmente alguém que veio neste mundo para desaparecer e ser esquecido um dia. Cada um tem a possibilidade de construir algo bom, de mudar para o bem o que parece errado, de doar algo para ser feliz e fazer felizes os irmãos. É a água viva do amor, da esperança, da fraternidade, que “jorrará” do coração de quem começa a satisfazer a sua sede na fonte de Vida que é o próprio Jesus. Continuaremos nos próximos domingos com as imagens-símbolos da “luz” e do túmulo de Lázaro. Em si, nada mais humilde e simples que a água. Mas ela dá vida e faz florescer o deserto. Quanto mais Jesus, pode motivar a nossa existência e nos conduzir à Vida plena de Deus Pai.

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