Artigo de Dom Pedro

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O padre sabe sempre tudo

Dom Pedro José Conti

Bispo de Macapá

Era o aniversário do pároco. As crianças estavam na fila para entregar os pacotes dos presentes e parabenizar o padre, em nome também das suas famílias. A pequena Maria entregou o seu embrulho e o padre disse:

– Obrigado, vejo que me trouxe um livro. O pai de Maria tinha uma livraria.

– Sim – disse a criança – Como o senhor adivinhou?

– O padre sabe sempre tudo – respondeu o pároco. – E você, Joãozinho, me trouxe um agasalho.

– Isso mesmo – disse João. A mãe dele tricotava a lã maravilhosamente. Chegou a vez de Marquinho, que entregou ao padre uma pequena caixa com o papel de embrulho todo molhado. O pai de Marcos vendia vinhos.

– Você me trouxe uma garrafa de vinho – disse o padre.

– Errado – respondeu Marquinho.

– Ah, sim. É uma garrafa de whisky e saiu um pouco.

– Errado de novo. O padre tinha os dedos da mão molhados, levou um à boca, mas não descobriu nada.

– É rum? Perguntou.

– Errado – exclamou Marquinho – Padre, eu lhe trouxe um cachorrinho!

Achar que já sabemos tudo ou que somos superiores aos nossos semelhantes, é, no mínimo, sinal de burrice, além da soberba inútil que nos cega. Também nas questões e na vivência da fé não é diferente. No evangelho de Lucas, deste domingo, Jesus continua a sua catequese sobre a oração. Depois de ter nos convidado à insistência, sinal de confiança total na bondade do Pai, convida-nos, desta vez, a rezar com humildade. O fariseu da parábola se considera simplesmente “perfeito”, porque cumpre rigorosamente os preceitos da Lei. É tão orgulhoso que despreza o cobrador de impostos, atrás dele, que reza de cabeça baixa. Este, conhecido pela profissão lucrativa, porque corrupta e desonesta, admite a sua situação de pecador e pede perdão. Como sempre, as parábolas de Jesus não satisfazem todas as nossas curiosidades. Não sabemos se o cobrador de imposto desistiu de roubar. O que interessa da parábola é a atitude – o coração, afinal – com a qual os dois rezam. O primeiro olha mais para os seus próprios méritos que para Deus; o outro sem coragem de levantar os olhos, reconhece assim a superioridade do Senhor e implora “piedade” pelos seus pecados. Este último, conclui a parábola, foi para casa perdoado, o outro não. Também porque, tão cheio de orgulho como era, nem tinha implorado a misericórdia divina. Não precisava, não tinha nenhuma falta…

A parábola nos leva mais longe, porém, de um ensinamento sobre a oração. O que está em jogo é uma maneira de entender as coisas de Deus e as coisas do mundo, a que, ou a quem, devemos a prioridade e, por isso, o nosso próprio jeito de viver a fé. É um claro alerta para todos nós e nos mostra o caminho certo para mudar conforme o evangelho de Jesus. Podemos dizer que o fariseu é um homem super-religioso, cumpre todas as normas e formalidades da sua religião, mas, no fundo, pensa com a mentalidade do mundo. Ele gosta de aparecer – está de pé -, gosta de se autorreconhecer merecedor, porque cumpre todas as ordens. Não faz isso por amor a Deus, por elevação espiritual ou porque quer vencer alguma tentação. O que ele quer mesmo é ser superior aos demais e, para isso, escolheu o caminho daquela que ele considera a “perfeição” nas obrigações religiosas. Apesar das palavras de gratidão, ele não tem nenhum sentimento amoroso de um filho com o Pai. Está cheio de si. Esta é a mentalidade do mundo, onde tem lugar para muitas práticas religiosas, basta que não sejam criticados os falsos valores do sistema e posta em discussão a injustiça social. O cobrador de imposto, ao contrário, é um homem do mundo, mexe com dinheiro, faz negócios escusos, no entanto, não se sente bem. Entende que algo está errado. Reconhece que devia e poderia ser diferente. Descobriu que o dinheiro ganho injustamente dá status, mas não dá a alegria e a paz do coração. Por enquanto, está só de cabeça baixa. Talvez, ainda, não sabe o que irá fazer, mas – e é o que vale – admite ser um pecador, pede misericórdia a Deus, porque o vê como o único capaz de perdoá-lo e dar-lhe uma nova vida. Se reconhece “pobre”, não sabe tudo. É humilde e insatisfeito. Não chama de whisky outra coisa. Merece o perdão.

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